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Crianças mais espertas.

17/01/2003

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Mais espertas, as crianças de hoje apresentam quociente de inteligência (QI) até 25 vezes mais elevado do que as da época de seus avós. A televisão, os video games e a internet são apontados como os principais responsáveis pelo aumento do QI infantil, que chegou a níveis jamais atingidos em gerações anteriores, segundo pesquisa internacional realizada pela Universidade de Cornell, em Nova Iorque (EUA).
Os estudiosos, que aplicaram testes em várias crianças de todos os países de cultura ocidental, constataram que, nas últimas duas décadas, o QI da garotada avançou 14 pontos, superando a expectativa de 3,5 pontos de aumento a cada dez anos.

Segundo Ulric Neisser, coordenador dos trabalhos, esse aumento não está distribuído de maneira igual, pois o bom desempenho registrado nas porções de raciocínio abstrato e pensamento não se repetiu nas capacidades verbais e matemáticas, que permanecem com índices praticamente inalterados.
Apesar de não haver pesquisas do gênero em Goiás, os especialistas da Capital endossam os estudos dos colegas norte-americanos. “Para perceber o salto no QI das crianças, basta estar atento a elas”, diz o neuropediatra Wander Santos dos Anjos.

“É fato. Sentimos isto no dia-a-dia, não só no consultório, mas também em casa. As crianças de hoje estão mais astutas, mais perspicazes. Meu neto, de 1 ano e meio, demonstra habilidades que minhas filhas, atualmente na casa dos 30 anos, não tinham com a idade dele”, revela.

Porém, o especialista alerta para o fato de que o aumento do QI infantil não é percebido entre crianças mal nutridas ou que têm pouco acesso à informação. “A inteligência está intimamente relacionada à boa nutrição e à quantidade de estímulos e informação a que a criança é exposta”, explica.

O psiquiatra Magno da Nóbrega observa que o QI é influenciado por uma série de fatores – emocional, cultural, social e até mesmo econômico – e sofre alterações ao longo da vida. “A inteligência depende de estímulos. Quando eles cessam, pode haver decréscimo de uma capacidade específica”, explica.

Também tomando por base a prática médica, a neuropediatra Maria das Graças Brasil concorda com os pesquisadores de Cornell. Aplicando a teoria de Piaget, na qual a inteligência das crianças deve ser observada sob dois parâmetros, o da fala e o das ações, a especialista encontra respostas para o fato de que as capacidades verbais e matemáticas tenham ficado de fora dos avanços.

“Estímulos como os do video game, da tevê e da internet trabalham a inteligência visual; portanto, aumentam o QI relacionado às ações. No entanto, a inteligência verbal, que deve ser exercitada através da leitura, do diálogo e das relações interpessoais, na minha opinião, tem decrescido entre as crianças, exatamente pelo fato de se isolarem para se dedicar exclusivamente a esses entretenimentos”, observa.
Caçulas considerados gênios da casa

O casal goianiense Nercírio Cataneo Júnior, 42, e Alessandra Lopes de Meneses, 38, não são cientistas nem médicos, mas comprovam na prática as teorias defendidas pelas pesquisas de Cornell e pela prática médica dos neuropediatras Wander Santos dos Anjos e Maria das Graças Brasil. Afinal, para Nercírio e Alessandra sobram horas de observação. Os dois acompanham bem de perto o desenvolvimento des seus três filhos: Daniel, 20, Danilo, 11, e Davi, 7.

“É impressionante a diferença. Daniel, comparado aos dois mais novos, teve um desenvolvimento mais lento, mas nem por isso diferente dos meninos da sua época. Danilo, cedo já demonstrou uma série de habilidades que o irmão mais velho só apresentou bem mais tarde. Davi, o caçula, superou todas as expectativas. Sem dúvida, ele é o mais esperto. Se deixar, põe fogo em caixa d’água”, brinca a mãe.

O pai acredita que a exposição à tevê, à internet e aos video games, entretanto, não tenha sido o único fator para acelerar o QI de Danilo e Davi, que, apesar da pouca idade, dão aulas de como usar o computador, navegar na internet e bater recordes nos jogos eletrônicos, sem contar o vocabulário vasto em diversas línguas.

“Eles são mais estimulados, recebem mais informações e parecem que têm maior capacidade para armazená-las. Aprendem sozinhos inglês, espanhol e o que mais precisarem para dominar as ferramentas e passar pelas etapas cada vez mais difíceis dos jogos eletrônicos. Mas não podemos nos esquecer de que o irmão mais velho também é uma fonte permanente de aprendizado”, diz.

O raciocínio de Nercírio está correto, segundo os especialistas. O convívio com outras pessoas é sempre fonte inesgotável de saber. Se não servir o exemplo das ações nobres e acertadas, aproveita-se pelo menos a experiência adquirida com os desacertos alheios. Desta forma, os pequenos vão crescendo e assimilando valores éticos e padrões de conduta moral, que geralmente não têm muito espaço nas telinhas da tevê ou dos computadores.

Aliás, os especialistas mostram uma preocupação especial em relação aos conteúdos de programas de tevê, jogos eletrônicos e internet. Segundo eles, na maioria das vezes as crianças ficam expostas a sucessivas lições de brutalidade, violência, competitividade desenfreada e vulgarização da sexualidade. (A.P.B.)
Equilíbrio é importante, diz psicóloga

A superinteligência das crianças modernas não é o bastante para que se tenha a garantia de que, no futuro, elas se tornarão adultos brilhantes ou bem-sucedidos. Ao contrário. Atualmente, o Quociente de Inteligência (QI) é o que menos importa para que alguém tenha uma vida feliz e de sucesso.

A moda agora é o Quociente Emocional (QE), que avalia não só a capacidade de memória ou raciocínio lógico – como o que ocorre com o índice que mede as capacidades intelectuais –, mas a soma dessas capacidades com a flexibilidade do indivíduo no ambiente em que vive.

“O emocional equilibrado é muito mais importante na vida de uma pessoa do que um QI alto. Do que adianta ser inteligentíssimo e não saber lidar com o meio em que vive, não saber como agir em situações adversas?”, questiona a psicóloga Marilda da Silveira, que desenvolve trabalhos na área de neuropsicologia.
A especialista, que aplica testes de QI e QE em crianças e adolescentes, explica que atualmente a inteligência é percebida de forma mais abrangente. “Hoje seguimos a teoria das inteligências múltiplas. As capacidades são avaliadas como um todo e analisadas sob o aspecto qualitativo”, explica.

Segundo ela – que não acredita em aumento de QI entre as crianças, mas em maiores oportunidades de expressão da inteligência –, nem sempre uma criança superdotada é feliz. Muitas vezes essas crianças, exatamente por ter maior percepção do mundo à sua volta, tendem a desenvolver quadros de depressão.

“Crianças com QI baixo costumam ter um nível maior de satisfação com a vida, pois não avaliam o contexto. Já os superdotados nunca estão satisfeitos, estão sempre questionando tudo e não raro entram em depressão”, alerta.

Teste faz análise da idade intelectual

O termo QI refere-se ao Quociente de Inteligência. O psicólogo Francês Alfred Binet foi um dos precursores do estudo da inteligência humana e idealizou testes para medi-la e, com isso, tentar melhorar o desempenho escolar das crianças.

A idéia original do teste seria comparar a idade cronológica com a idade intelectual. Definiu-se que o QI médio sempre vale 100 pontos. Uma criança, digamos com 5 anos de idade, que apresentasse um QI de 120, teria, portanto, uma idade intelectual 20% acima da inteligência média, ou seja, esta criança teria uma idade intelectual média equivalente à de uma criança de 6 anos de idade.

No caso de adultos, entretanto, faz muito pouco sentido dizer que uma pessoa com idade de 40 anos tenha a idade intelectual de um adulto de 48 anos. O número do QI, para adultos, passa a ser pouco significativo e, em geral, é melhor classificar a inteligência em termos de percentagem.

Assim é mais objetivo dizer que uma pessoa tem uma inteligência maior do que, por exemplo, 98% da população, do que dizer que o QI é, por exemplo, 148. (A.P.B.) .

Diário da Manhã (GO) – Ana Paula Bravo