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Loteria das Mentiras

03/04/2012

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Helder Caldeira *

Vejam só como são as coisas: bastou a Polícia Federal vazar as 300 ligações entre o contraventor Carlinhos Cachoeira e o senador Demóstenes Torres (DEM/GO) para, imediatamente, a maior emissora de TV do Brasil produzir uma matéria tendenciosa – e até mentirosa – sobre a realidade dos bingos e cassinos no país. E o pior: certamente uma pseudomatéria comprada pela máfia política que infesta o Congresso Nacional e os bancos estatais, principais interessados na manutenção da proibição dos jogos em nossa tapera tupiniquim.
Vamos observar com bastante cuidado o que revela um dos trechos das conversas entre Demóstenes e Cachoeira. Nele, o senador democrata alerta o bicheiro que o Projeto de Lei nº 7.228/2002, do ex-senador Maguito Vilella (PMDB/GO), que está parado na Câmara dos Deputados, visa transformar a exploração de jogos de azar em crime, ao invés de simples contravenção. Demóstenes diz: “Isso, inclusive, te pega, né?!” E o que bicheiro responde? “Pega não! É bom demais! Regulariza as [loterias] estaduais. (…) Você tinha que trabalhar isso com o Michel [Temer, atual vice-presidente da República e, à época (2009), presidente da Câmara] pra por em votação. Isso aí é interessantíssimo!”
Ou seja, não interessa ao contraventor a legalização dos bingos e cassinos, pois é justamente sua proibição que permite a manutenção de seu arco de poder através da compra de autoridades (juízes, desembargadores, ministros, delegados, promotores, governadores, prefeitos, senadores, deputados e vereadores) e de legendas partidárias, para que permitam seus negócios na clandestinidade. O que realmente importa ao criminoso é a regulamentação das loterias estaduais, conhecido antro de bilionários desvios de dinheiro público.
Não por acaso, foi a Carlinhos Cachoeira que Waldomiro Diniz recorreu, em 2004, para arrecadar dinheiro sujo para o “Caixa Dois” de campanha do PT e do PSB, inaugurando a série de escândalos que devastou o primeiro governo do ex-presidente Lula. Naqueles dias, Waldomiro era o principal assessor do então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu. Também não é por acaso que, até eleição de Lula em 2002, Waldomiro Diniz era presidente da Loteria do Estado do Rio de Janeiro (LOTERJ). Mas esse tipo de apuração não interessa nem aos veículos de comunicação, já que essas loterias estaduais são bastante “generosas” na compra de espaços de publicidade nos jornais, revistas, portais e emissoras de TV.
É exatamente essa dinâmica nauseabunda que corrompeu e afundou o senador goiano Demóstenes Torres, tornando-o uma decepção nacional. Muito provavelmente vão afoga-lo no lamaçal – tal qual um boi de piranha – para preservar autoridades de todas as espécies e de todas as instituições, que estão envolvidas no monumental esquema de Carlinhos Cachoeira e de bicheiros e contraventores congêneres. Não é novidade pra ninguém que esses criminosos financiam a eleição de muitos, bancam a imprensa e são os diletos patronos do Carnaval brasileiro, tão celebrado como cartão postal do nosso país.
Em nome da manutenção dessas excrescências corruptas, há a promoção deslavada da proibição dos bingos e cassinos como bandeira de fé e de moralidade, escondendo os reais motivos da proibição e criando matérias de mídia como a exibida no último domingo. Basta observar a quantidade comerciais de estatais – como a Caixa Econômica Federal – veiculados durante os intervalos do programa. Proteger bandidos custa caro, minha gente! O pior é concluir que quem está pagando a conta dessa imundice somos nós, os brasileiros idiotas, doces contribuintes dessa farra.
Que ninguém se engane. O que há de verdade nessa demonização dos bingos e cassinos no Brasil é a tentativa de mantê-los proibidos legalmente, para que os partidos políticos, os parlamentares corruptos, os governos indecentes e até os veículos de comunicação volúveis e sem linhas editoriais sérias e comprometidas com a ética, possam seguir alimentando a indústria das propinas, do “dinheiro por fora”, do “caixa dois”, da grana que verte dos cofres públicos direto para o bolso dos mamateiros. E isso só é possível porque o povo brasileiro é tão tolo e manipulável, quanto hipócrita. Até parece que gostam muito de sustentar essa bandalheira. Não por acaso, os bingos e cassinos só são proibidos em dois países no mundo: no Brasil e no Iraque!
P.S.: Convido-os a assistir meu comentário sobre “A Legalização dos Bingos e Cassinos no Brasil”, onde revelo verdades duríssimas sobre o assunto, no “iPolítica”, quadro de análises exibido nos telejornais da Rede Record de Mato Grosso. Confira a íntegra em nosso canal de interação no YouTube: http://www.youtube.com/watch?v=3-cGXqYpQt8 ou http://www.youtube.com/ipoliticarederecord.
(*) Helder Caldeira é um escritor, jornalista, colunista político e conferencista brasileiro. É autor de A 1ª Presidenta, primeiro livro publicado no Brasil sobre a trajetória política da Presidenta Dilma Rousseff, pela Editora Faces. Assina colunas políticas e colabora diariamente  com mais de quatro dezenas de jornais de norte a sul do Brasil, além de publicações internacionais.