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Os argumentos do bingo.

13/01/2003

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Luis Nassif
A Associação Brasileira dos Bingos (Abin) entra em contato para questionar algumas informações do Ministério Público acerca da atividade. A primeira, a de que a atividade serviria para lavagem de dinheiro. Segundo a Abin, a denúncia surgiu após uma importação específica da Itália, supostamente com dinheiro da Máfia. Foi aberto um inquérito que, três anos depois, nada apurou. Além disso, a Abin sustenta que há que se separar as máquinas de padaria daquelas dos bingos oficiais, que seriam honestas e trabalhando com o conceito de rateio.
Não há porque duvidar das informações, mas o buraco é mais embaixo: é a questão do bingo como ameaça à saúde pública.
Em todos os países civilizados, há cada vez mais medidas de repressão às chamadas doenças sociais, como a droga, o alcoolismo, o tabagismo e o jogo. Mas não se pode comparar o ato de beber com o ato de jogar. A disseminação do alcoolismo não depende da quantidade de bares existente, nem os alcoólatras representam porcentagem elevada dos freqüentadores de bares.
Já o jogo -especialmente o bingo- é uma compulsão que depende basicamente da facilidade de acesso aos cassinos. Não se venha com o argumento de que, se proibir o jogo, os viciados irão recorrer a cassinos clandestinos. As donas de casa, os aposentados e as pessoas humildes frequentam bingos pela proximidade e pelo fato de ser atividade legal e aceita pela sociedade. Apenas uma pequena porcentagem aceitaria correr os riscos de frequentar cassinos clandestinos.
No ano passado foi feita pesquisa em um bingo de São José dos Campos que mostrou que 45% (!) dos freqüentadores são jogadores patológicos. Em 1997, outro estudo “Jogo Patológico: Um Estudo Sobre Jogadores de Bingo, Videopoker e Jockey Club”, de Maria Paula de Magalhães Tavares de Oliveira, do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, classificou 33% dos frequentadores como jogadores patológicos.
Os dois estudos foram feitos por pesquisadoras do Proad (Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes), da Unifesp. Para o psiquiatra Marcelo Fernandes, que coordena o ambulatório de jogadores patológicos da Unifesp, o bingo democratizou o vício do jogo e já é a modalidade preferida entre dependentes, desbancando inclusive a loteria.
Velho adversário do jogo, das poucas pessoas que tentaram barrar a autorização aos bingos, o ex-senador José Serra escreveu artigo na época (republicado em seu recém lançado livro “Ampliando o Possível”), rebatendo mitos do jogo, como o de que os cassinos significariam mais empregos ou recursos externos para o país.
Em Las Vegas, cidade com a maior concentração de cassinos do mundo, 8,7% da população adulta (ou 70 mil pessoas) tem algum problema ligado ao jogo. No estado de Nevada (onde está Las Vegas e onde existem mais cassinos e há mais tempo nos EUA), o número de casos de suicídio é duas vezes maior do que na média do país. Estudo de 1995, feito em Iowa, mostrou que 5,4% da população do Estado tinham, naquele ano, algum problema mais sério com o jogo, contra apenas 1,7% da população antes da abertura dos barcos-cassinos na região.
Em Atlantic City, metade dos restaurantes da cidade fechou as portas dois anos depois da abertura dos cassinos na cidade, no final dos anos 70. Em Illinois, em 1995, a operação dos cassinos provocou perdas de US$ 1,9 bilhão para o comércio local. No mesmo Estado, todos os efeitos “positivos” trazidos pelos cassinos (pagamento de salários e compras na região) totalizaram US$ 1,8 bilhão também em 1995.
Em Wisconsin, o número de crimes cresceu 6,7% depois da abertura de cassinos. Somando-se os casos de crimes que decorrem indiretamente do jogo (como maus-tratos e agressões cometidas por viciados), o número cresceu para 9%. Como bem lembra Serra, o volume de dinheiro que circula em torno do jogo é suficiente para atrair dinheiro sujo, proveniente do tráfego de drogas e outras atividades ilegais.
Folha de S.Paulo

Carta do Editor do BNL
Caro Nassif,
Olá!
Venho acompanhando a série de artigos que você vêm veiculando na Folha de São Paulo e como editor do Boletim Novidades Lotéricas tenho que informar ao colega que o ex-senador José Serra não pode ser considerado uma boa fonte. Em seu texto do último dia 11 de janeiro, você citou várias informações extraídas do livro “Ampliando o Possível”. Elas também serviram para artigo “O Jogo Errado” veiculado na Folha de São Paulo, em 1998, contra o Projeto de legalização dos cassinos que estava tramitando no Senado Federal.
Muitas dessas informações são equivocadas e algumas até mentirosas, já que o senador não tomou o devido cuidado com as fontes que citou no seu artigo e foi traído.
Não quero que você também seja traído ou cometa aquele velho erro, que uma mentira repetida muitas vezes, vira uma verdade absoluta.
Como tenho grande admiração e por acreditar que você é um jornalista formador de opinião, seguem abaixo algumas informações para seu conhecimento.
Coloco-me ao seu inteiro dispor para quaisquer esclarecimentos.
Atenciosamente,
Magno José – Editor do BNL

Comentário
Com relação às informações do livro “Ampliando o Possível” e do artigo “O Jogo Errado”, publicado pela Folha de São Paulo na edição do dia 29.03.98, no caderno Dinheiro, assinada pelo senador José Serra, gostaríamos de fazer alguns esclarecimentos que julgamos importante e também demonstrar que o senador foi induzido ao erro pela sua principal fonte, o economista, Ricardo Gazel, Professores Dan Rickman e William Thompson.
José Serra – “Em primeiro lugar, os cassinos não trarão recursos externos significativos para o Brasil, por meio de turistas estrangeiros que viriam jogar aqui no Brasil ou de brasileiros que deixariam de jogar lá fora”.
É do conhecimento de todos que, anualmente, milhões de brasileiros visitam a Argentina, Paraguai e Uruguai e que a grande parte destes turistas, freqüentam também os cassinos destes países para jogar. Estes cassinos recebem milhares jogadores brasileiros provocando uma expressiva e danosa evasão de divisas do país de milhões de dólares. Através de pesquisas está provado que mais de 70% do movimento desses cassinos advêm de brasileiros.
Segundo o Las Vegas Convention and Visitors Buereau, 60 mil brasileiros visitam Las Vegas anualmente.
Com a legalização e a abertura de cassinos do Brasil, haveria uma ampliação do período médio de permanência do turista estrangeiro no país. Outra vantagem seria a redução efetiva da diferença nas taxas de ocupação da hotelaria entre a alta e a baixa estação, pois os cassinos promovem e subsidiam uma extensa programação de eventos culturais, artísticos, musicais e esportivos na baixa temporada para atrair turistas provocando o crescimento substancial do turismo interno. Como resultado imediato, seriam aportados investimentos significativos na construção de novos hotéis e empreendimentos turísticos em nossas estâncias hidro-minerais, climáticas e balneárias.
José Serra – “Aliás, os cassinos provavelmente aumentaria o déficit do balanço de pagamentos, em face de importação de equipamentos…”
A indústria brasileira já está capacitada a produzir a maior parte dos produtos essenciais para a implantação dos cassinos no Brasil.
José Serra – “Em segundo lugar, tenhamos presente: de onde viria a receita dos cassinos? Evidentemente, do bolso dos jogadores, principalmente da classe média para baixo”.
Este argumento é desprovido de qualquer fundamento, fruto do desconhecimento dos padrões de modernidade da indústria dos cassinos. Existem diversos métodos para evitar a freqüência em cassinos de pessoas de baixa renda. Um dos mecanismos mais simples e eficaz de todos, é taxar o ingresso no cassino em valor suficiente para inibir ou inviabilizar o acesso de pessoas de baixa renda. Outro mecanismo de contenção do ímpeto do jogador já consta do próprio Projeto de Lei ora em exame, que é a proibição dos cassinos de conceder linhas de crédito aos apostadores.
Vale lembrar que as populações de baixa renda, já vêm sendo explorada pelos jogos populares, administrados pelo próprio Governo. A abertura de cassinos promoveria para estas populações, um novo e expressivo mercado de trabalho e não uma ameaça.
José Serra – “No entanto, acredite o leitor, a experiência norte-americana desaconselha a implantação de cassinos no Brasil…”
“Vício”
O senador José Serra, tomou como referência os estudos do economista Ricardo Gazel, ex-professor da Universidade de Nevada. Este trabalho é contestado pela divulgação em dezembro de 1997, de recente pesquisa realizada pela Universidade de Harvard Medical School que através de estudos científicos, realizados nos últimos 20 anos, constatou-se que apenas 1,29% da população adulta dos Estados Unidos e Canadá sofrem algum tipo de patologia de jogador compulsivo.
José Serra – “Um estudo feito em 1990 em Maryland estimou que tais fatores provocaram prejuízos de 1,5 bilhão de dólares no Estado, devido ao jogo…”
O Senador foi induzido a cometer outro grave equivoco com relação a esta afirmação. Jogo de cassino nunca foi permitido no Estado de Maryland. O que já existiu neste Estado, foram jogos de carteados patrocinados pelo Corpo de Bombeiros para fins beneficentes e desde maio de 1997, esta atividade também foi proibida, pelo fato de não ter regulamentação estadual e/ou municipal.
“Criminalidade”
José Serra – “Por que aumentam o crime? Porque o volume de dinheiro que circula em torno do jogo é suficientemente grande para atrair o dinheiro sujo, proveniente do tráfico de drogas e outras atividades ilegais”.
O FBI – Federal Bureau of Investigation, iniciou há 60 anos o Programa UCR (Uniform Crime Report), baseado em ocorrências criminais dos Estados Unidos. O principal objetivo deste programa, é formar um banco de dados com estatísticas reais para serem utilizadas na administração, gerenciamento e operação das policias municipais, estaduais e federais. Com o nome de “Crime In the United States”, este programa é a principal fonte de pesquisa de sociólogos, jornalistas, criminalistas, legisladores, pesquisadores estudantes, entre outros.
Para falar sobre criminalidade, consultamos o Relatório do FBI citado acima, publicado em dezembro de 1997, que afirma o seguinte:
As cidades que têm cassino legalizado são classificadas como cidades mais seguras dos Estados Unidos. (Página 24a)
As cidades com cassinos legalizados têm menos crimes de rua do que cidades com potencial turístico. (Página 25a)
Apesar de ser a cidade com o maior índice de crescimento populacional dos Estados Unidos, Las Vegas tem o menor índice de criminalidade comparado com todas as cidades turísticas da América. Essa segurança não é fruto de um substancial aporte de recursos aplicados no aparato policial. Pelo contrário, o Departamento de Polícia Metropolitana de Las Vegas apresenta um dos menores números de policiais por habitante, do que qualquer outra grande cidade americana. (Página 27a)
Em Atantic City os índices de criminalidade vêm caindo ano após ano, desde 1992, apesar do aumento do número de visitantes. (Página 29a)
“Desvio de renda e canibalização de atividades”
José Serra – “Em Atlantic City, metade dos restaurantes da cidade fechou as portas dois anos depois da abertura dos cassinos na cidade”.
Segundo estudo da Arthur Andersen Consultants publicado no Boletim da Americam Gaming Association de março de 1998, demonstra que os gastos nos cassinos não estão sendo subtraídos de outros segmentos da industria de entretenimentos. Como exemplo podemos citar: entre 1977 (três anos após a abertura dos cassinos) e 1987, o número de restaurantes na área metropolitana de Atlantic City aumentou em 120%. Em 1994, a indústria de cassinos de Atlantic City gastou US$ 1.35 bilhões nos 4 mil estabelecimentos comerciais de New Jersey.
Segundo o estudo sobre “Impacto Econômico da Industria de Cassinos”, elaborado pelo Evans Group em setembro de 1996, o valor dos imóveis em Atlntic City tiveram uma valorização de 200% entre 1997 e 1980, quando foram criados 30 mil novos empregos na indústria do cassino. Em 1995, 31 milhões de turistas visitaram a cidade que faturou US$ 3.77 bilhões em 12 hotéis cassinos.
José Serra – “Quem vai a Iowa jogar? … Fazendo um balanço do que o Estado ganhou e do que perdeu após a abertura dos cassinos, constatou-se um prejuízo de 125 milhões de dólares…”
Outro equivoco do senador José Serra. Segundo o estudo sobre “Impacto Econômico da Industria de Cassinos”, elaborado pelo Evans Group, os cassinos de Iowa faturaram US$ 239 milhões em 1995, US$ 265 em 1996 e US$ 293 em 1997. Ao contrário da informação dada pelo senador, o Estado de Iowa arrecadou em impostos nesses três anos à importância de US$ 153 milhões diretamente dos cassinos. Se forem considerados os impostos de todos os jogos praticados no Estado esse número aumenta para US$ 375 milhões.
Para finalizar, vamos demonstrar que o senador José Serra foi induzido ao erro pelas suas fontes, ao afirmar que:
“Segundo o Instituto Americano de Seguros, nos Estados Unidos, 40% dos crimes de colarinho branco têm raízes no jogo”.
No Relatório do UCR (Uniform Crime Report) do FBI – Federal Bureau of Investigation, sobre “Casinos and Crime: An Analysis of the Evidence”, publicado em dezembro de 1997, na página 55a, que traduzimos na íntegra e anexamos uma cópia, informa:
Afirmações sem fundamento:
“Indiscriminadamente tem-se afirmado que Instituto Americano de Seguros (American Insurance Institute – AII) estima que 40% de todos os crimes de colarinho branco são relacionados ao jogo. Esta estimativa tem sido propagada em debates, relatórios direcionados, várias histórias de jornal e recentemente no livro anti-jogo do Robert Goodman. Porém, o fato é que esta estatística não pode ser verificada por um único fator determinante: o Instituto Americano de Seguros não existe.”